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SWU – Longe de ser um festival

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Dia 9 passado fui a São Paulo pro tal festival SWU – Music and Arts, evento que teria como carro-chefe o movimento de conscientização em torno da sustentabilidade planetária, reciclagem, ecochatices em geral.

Digo isso criticamente porque, em teoria, é o tipo de coisa que se torna utópica manifestar, quando se tem grandes bandas e um evento com um line up considerável. São dois interesses bem distintos, tanto o ideológico-musical como o ideológico-sustentável. Mas a proposta dos organizadores era fundir isso. Vamos conferir in loco então.

 

Depois de uma manhã de vôo atrasado, idas e vindas em aeroportos paulistas, check-in no hotel e aluguel de carro, rumei a cidade de Itú. Longo caminho, assim como em qualquer deslocamento em São Paulo.

A princípio, iríamos deixar o carro em um “bolsão”, que nada mais é do que um estacionamento fora da fazenda. E o resto do trajeto, dentro de um ônibus fretado. Seguimos a risca, toda e qualquer informação dada no site oficial do evento. Fomos extremamente metódicos, cabe ressaltar.

Com a ajuda de um GPS, traçamos o destino como aquele que seria o local do bolsão. Encontramos algumas fábricas e estabelecimentos comerciais. O resto, um mato alto, semelhante aos de beira de BR-101. Tornos e retornos, seguimos o (alto) fluxo de carros, que se enfiltravam em uma estreita estada de chão batido. Sustentando a idéia de dar carona para todos os amigos e, assim, menor poluição, o festival cobraria R$ 100 sobre carros com menos de 4 pessoas. Lúdico. As amizades têm seu valor, sim.

Temendo esse gasto, parávamos constantemente ao lado de pessoas identificadas com o emblemático emblema do festival, buscando valiosas (!!!) informações. O discurso era o mesmo: o único estacionamento oficial do evento era aquele que rumávamos. E que sim, era o de cem reais. Essa era a única informação dada. Alguns quilômetros de estradas-congestionadas-sem-asfalto, longe depois, encontramos estacionamento entitulado “comum”. Comum, pois só pessoas comuns poderiam utilizar. Esquizofrênicos, loucos e complexados, que vão pra casa!

Pouco antes da entrada, dois rapazes se ofereceram a completar o carro, em troca de 10 reais cada. Pensei: “Uau, que forma inteligente de ganhar dinheiro”, mesmo sendo um risco extremamente alto. Azar. Passamos pelo portão, pagamos ínfimos (sic) R$ 50 e deixamos os dois moçoilos estranhos, vinte reais mais ricos.

 

O estacionamento comum nada mais era que um lugar descampado e desprovido de iluminação. A única fonte de luz era um poste que ficava ao lado da entrada, provocando assim uma luz difusa e que dificultou absurdamente na hora de ir embora. Ficamos tal como idiotas bêbados procurando o carro, mesmo nem sendo tão idiotas e sem ter bebido uma gota sequer de álcool, pelos motivos que citarei mais adiante.

Longe. A estrada que ligava o estacionamento ao portal de entrada do evento ficava em uma distância considerável. Chuto algo em torno de 2 ou 3km. Estreita, de duplo sentido para automóveis, escura. Escura mesmo.

Na entrada, uma dupla revista. A primeira, pra aqueles que portavam mochila. Qualquer tipo de alimento, água ou semelhante, era sumariamente empilhado em frente a entrada. Na segunda, revista pessoal.

Em uma breve teoria, constatei que era sim possível entrar com drogas e armas, mesmo sob esse esquema ríspido de revista. Muito simples: ao passar pela primeira, coloque sua pistola embaixo da camiseta, na cintura. Quando passar para a revista pessoal, recoloque sua arma dentro da mochila e pronto. Chacina sustentável.

Na hora de entregar o ingresso, mais uma falha. Sequer precisei da minha identidade ou carteirinha de meia-entrada. Nenhuma das duas fora solicitada, para entrar no local. Como primeira impressão, o SWU perdera pontos comigo.

Corrida em direção ao palco, enquanto o Camelo entoava os primeiros acordes do show. Dois monstros brancos se situavam na frente do palco, e dentro deles, a equipe que ia transmitir os últimos shows na íntegra. Gente espremida até o primeiro gradil, que separava os comuns dos Premium. Avancei alguns metros pra enxergar os pontos musicais no palco, um desafio. Me contentei em ver o Camelo, Amarante, Barba e o Bruno assim, pelo telão.

 

Foi um bonito show, de verdade. Não consigo comparar esta apresentação com aquela que eu presenciei, 4 anos atrás. A diferença entre as duas era de uma hora a mais de show e uns 500 metros de distância. O Camelo ostentava uma barba horrendamente mal-feita, o Amarante de uma camisa de bicheiro e o Bruno Medina com um figurino herdado da série The Big Bang Theory. Os Hermanos tinham na formação um baixista diferente. Onde estaria o Gabriel Bubu numa hora daquelas? Vendo o show de uma maneira semelhante à minha, no conforto do seu lar?


Hermanos fora do palco, equipamentos sendo desmontados para dar lugar pros Rage Against. Enquanto isso, o Mars Volta subia no palco ao lado. Longe. A distância entre palcos era grande. De tal modo que você pouco enxergava o que estava no palco a sua frente. Enxergar o palco anexo era praticamente um desafio.

Sob uma certa intolerância dos presentes, os TMV arregaçam em palco. Sou fã dos caras desde o At the Drive-In, e ouvinte do Mars Volta desde os 16 anos. Era um show que eu mantinha uma alta expectativa e, infelizmente, nada poderia fazer pra chegar perto de Omar, Cedric e Cia. Precisava garantir um lugar, no palco do RATM.

 

The Mars Volta deu uma aula de roque. Aula daquelas em que você se arrepende em não ter anotado todas as dicas, todas as lições. Senti falta do baterista-monstro-afro que costumava destruir os tambores. Também foi notável a ausência do guitarrista base, que segurava os riffs enquanto Omar Rodriguez-López praticava uma espécie de virtuose do séc. XXI, empunhando sua guitarra.

Com diversos efeitos, inclusive na voz, e um repertório coeso e preenchido com psicodelias, os Mars Volta me agradaram por completo, em tão pouco tempo de show. Pra suprir a falta de “The Widow”, eles fecharam o show com “Roulette Dares”, música que serviu como cartão de visitas pros caras, na minha época de adolescente.

Passado a euforia dos Volta, me concentrei nos longos minutos que separavam do show que eu mais esperei, nesses 20 anos de vida. Empurra empurra, expectativa e… vontade de ir ao banheiro. Pouco mais de 15 minutos depois, a inconfundível estrela vermelha da banda aparece no telão. Uma sirene ecoa por toda a Fazenda Maeda.

Uma voz surge em cima do palco:

– Good Evening, we are Rage Against the Machine from Los Angeles, California.

Poucas vezes tive a oportunidade de ver uma interação tão grande do público com a banda. As pessoas pulavam, gritavam. Frequentemente, mochilas e tênis voavam sobre minha cabeça. Testify abria o final da noite, em grande estilo. Como parte do meu sedentarismo, os primeiros trinta segundos de música foram o suficiente para que eu sofresse uma falta de ar súbita. Já fui melhor com essas coisas.


No palco, Tom Morello fazia tudo isso e muito mais, com o dobro da minha idade. O cara é realmente impressionante. Ao vivo, ele consegue ser um DJ, assim como sugerido por Zack de La Rocha, em “People of the Sun”. Consegue tirar timbres e sons absurdos da guitarra, sendo virtuose em vários momentos. Cada solo é uma surpresa. Somado a isso, ele pula e interage com o público de uma maneira que muitos músicos deveriam aprender. Tom Morello é, definitivamente, um cara a ser estudado.

No meio da música “Township Rebellion”, o som dos P.A’s some. O silêncio toma conta da fazenda e inúmeros focos de protestos soam. Coisas como “SWU, vai tomar no cu” eram cantadas em uníssono pelos presentes. A fúria aumentava. De longe, via-se a banda quebrando tudo e nós, éramos brindados pelo som baixíssimo dos instrumentos lá longe.

Ao longo do show, mais um ou dois cortes, uma ou duas paradas. No meio de uma música, a pista Premium foi invadida pelos comuns. Em uma das paradas, uma voz soou:

– Pedimos a colaboração de todos para que dêem três passos pra trás.

A voz teve como colaboração o próprio Zack de La Rocha, que repetiu as palavras, só que em língua ianque. Compreendido, foi alvejado com uma calorosa salva de palmas. Ali ficara claro que, ao contrário do noticiado em diversos veículos midiáticos, não houve um pingo de violência consentida naquele momento de pouco mais de uma hora. O que se via eram pessoas como eu, que esperaram longos anos por aquele momento, e que sentiam-se frustradas por presenciar tantos empecilhos oriundos da organização.

 

O engajamento político da banda era notável. Ditos socialistas, De La Rocha cantava versos contundentes com uma convicção ímpar. Tal qual em um comício ou em um protesto. Mais do que músicos, o Rage é formado por um grupo de militantes. A exemplo disso, no meio do show rolou um playback do hino comunista. Isso sem contar em a dedicação de “People of the Sun” para os irmãos e irmãs do movimento MST. Há quem se engane que o Rage Against the Machine use como a música como fachada, em prol de seus ideais políticos. Muito pelo contrário.

Poucas foram as vezes em que eu vi uma banda tão entrosada no palco, mas ao mesmo tempo tão natural. O timbre de baixo de Tim Commerford era invejável. A bateria de Brad Wilk soava bem, notavelmente equalizada. Morello seguia inventando solos e tirando sons espaciais da sua guitarra e de seus pedais de efeito. Zack comandava o quarteto, com uma presença de palco e uma fúria que leva no nome da banda. Esse era o Rage Against the Machine, maestros naquela noite fria em Itu.

 

Após o show, correria para os banheiros, saída e praça de alimentação. Enquanto procurava os toaletes – que até hoje não encontrei – comecei a reparar na estrutura do evento. Poucos demonstrativos daquele que seria o carro-chefe do SWU. Nitidamente uma ideologia de fachada. Latas de lixo lotadas, obrigando o público a jogar latas e garrafas no chão e alguma coisa ou outra de placas informativas.

Poderia muito bem fazer outro texto só pra relatar os valores e tamanhos de alimentos e bebidas. Mas resumindo: a patrocinadora de cerveja do evento exigia R$ 6 em uma latinha de cerveja. A outra patrocinadora de água mineral cobrava R$ 4 em uma garrafa d’água que lembrava aquelas garrafinhas minúsculas de guaraná de festa infantil. Alimentos, beiravam a casa dos R$ 10. Longas filas na praça de alimentação, pouco plantel pra atender. Um caos.

Na saída, uma cena típica de filme de catástrofe em Nova Iorque. Uma fila interminável de pessoas mortas (de cansaço), sem qualquer opção se não caminhar. Em volta, carros e ônibus completamente parados. Como relatou o Estado de São Paulo, uma catarse.

 

Concluo que o SWU está longe de ser um evento bem estruturado. E mais do que isso, está tornando antipático o fato de segregar pessoas com a profusão de ideais vazios e ecológicos. Ano que vem o Rock in Rio volta ao Brasil, e em seu twitter oficial, a organização anunciou oficialmente que não haverá área VIP. Aos organizadores do SWU, vale a ida. Aprender com gente experiente pode também se tornar enriquecedor.

 

Written by Cisco

outubro 13, 2010 at 5:35 pm

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