Calos

Todo músico tem um paradigma terrível e doloroso quando inicia nessa vida de perda de cabelos e ganho de paciência: os calos nos dedos.

Instrumentos de cordas são feitos de… cordas (ah?), que nada mais é que um filamento de metal enrolado por outro filamento menor, formando uma micro-espiral que, no final das contas, lixa o dedo. O dedo, não a unha.

Quando alguém toma a iniciativa de pegar e estudar tal instrumento, é habitual que tu te irrite com aquilo nos primeiros dias. Isso se dá conta da inexperiência e, por deus, é bobagem achar que “nunca vou levar jeito pra isso”.

Mas sem dúvida, quem ultrapassa a tal barreira do primeiro momento, dá de cara com a dolorosa experiência da falta de calinho no dedo. O calinho, na verdade, é um tanto psicológico.

Tá, ok, ele realmente existe, e acredito que tu possa estar pensando: “Bah, mas eu tô sentindo ele, aqui ó!”, enquanto roça teu dedão na ponta dos outros dedos. Mas este, nada mais é que um efeito da prática incessável do fator. Talvez eles, os calinhos,  sejam efeito daquela música que tu acha legal e que, era mais difícil do que tua habilidade no momento. E que te fez perder algumas noites praticamente em claro, treinando incansávelmente, até teus dedos ficarem róseos. Eis que, depois de vários e vários dias, tu finalmente consegue tocar ela sem um errinho, até se dar conta de que ela não era tudo aquilo. E que perdeu a graça, agora que teu domínio perante a música é pleno.

Depois tu descobre outra música legal. E outra. E outra.

Calinhos ocorrem em relacionamentos. De início, nossa inexperiência afeta diretamente o todo. A dor é inevitável, mas com o tempo, criamos barreiras para que ela amenize e fique mais tênue.

Com a prática, os calos aumentam. A dor diminui e tu te tornas uma pessoa mais racional sobre o assunto. Portanto: não existem pessoas mais ou menos frias nos relacionamentos. Existem pessoas que já suportam a dor e agem mais com racionalidade.

Apesar dos calos, dedos ainda sim são dedos.